quarta-feira, 6 de julho de 2011

Carta de Alforria

O filme DIA DE PRETO conta a história do primeiro escravo libertado no Brasil, a partir de um episódio lendário que teria acontecido em 1661, na região da Porta D’Água, atual bairro da Freguesia de Jacarepaguá, no Rio de Janeiro. Nessa época, a “carta de alforria” era o instrumento legal utilizado para conceder a liberdade aos cativos, muito embora a maioria dos seus beneficiários (e até os senhores, diga-se de passagem) fosse analfabeta.

Para a confecção da carta, a equipe de arte do filme realizou uma pesquisa sobre os modelos usados no período, de forma a produzir o tipo de papel, textura e caligrafia similares às do século XVII. Ao lado, você confere uma dessas referências.

O conteúdo da carta cenográfica foi escrito pelo Diretor Marcial Renato. Um texto sobre a própria realização do filme, fazendo uma analogia entre a “libertação” do escravo e o fim da fase de produção, que terminava justamente com a gravação daquelas cenas de época. Uma longa e trabalhosa etapa que, de certa forma, também “escravizou” os realizadores durante bons anos.

A título de curiosidade, apresentamos a íntegra da nossa tão sonhada “Carta de Alforria”, que você confere no texto e imagem abaixo:

“Decorridos 1999 anos do nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo, três jovens amigos moradores da periferia de São Sebastião do Rio de Janeiro, em nome da liberdade, resolveram se dedicar à produção de um longa-metragem, aventura insana e insalubre.

O que os mancebos não poderiam imaginar é que a audácia da decisão acarretaria um estado de escravidão que duraria pelo menos os oito próximos anos de suas até então curtas vidas, visto que os três contavam apenas vinte e cinco voltas ao redor do sol, tempo equivalente à quarta parte da vida que tinham experimentado quando toparam o desafio.

Da escravidão à angústia, e dessa a uma sucessão de estados de penúria espiritual e material, sempre à porta de possíveis mecenas e outros recursos necessários à realização do projeto. Tentados pelos demônios mais obscuros da alma humana, mergulharam fundo naqueles pecados que só podem ser redimidos pela confissão: a inveja de outros realizadores; a vaidade moral, acadêmica ou profissional; a preguiça de quase desistir; a luxúria de se entregar a prazeres proibidos; a gula de quem quer mais do que o conviva; a avareza para conseguir os fundos que garantiriam o negócio; e a ira causadora de brigas e ofensas que sempre doeram mais no agressor do que no agredido.

Superando a tudo e a todos, mais do que amigos, os três tornaram-se irmãos, de sangue, suor e lágrimas. Justamente por isso, neste dia 26 de novembro, 2007 anos após o nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo, os três fazem jus à liberdade que o sonho humano alimenta, que não há ninguém que explique, nem ninguém que não entenda. Sem mais para o momento, eu os declaro alforriados.

PS: Sabendo que era impossível, foram lá e fizeram”

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